Foto: Loise Maria/Governo do Tocantins
Em uma iniciativa que busca mais do que apenas prestar serviços, mas também marcar presença institucional onde o Estado costuma ser ausente, a 2ª edição do projeto Defensorias do Araguaia chegou nesta quarta-feira (27) à Aldeia Fontoura, na Ilha do Bananal, em Lagoa da Confusão (TO). A ação reuniu Defensorias Públicas de três estados — Tocantins, Goiás e Mato Grosso — e contou com apoio de diversas secretarias do Governo do Tocantins.
A proposta é oferecer atendimentos jurídicos, de saúde e assistência social diretamente nas aldeias, respeitando os contextos locais. Desta vez, o foco foi o povo Karajá, que vive em uma das regiões mais isoladas do estado. O acesso difícil não impediu uma mobilização expressiva: foram realizados diversos atendimentos, incluindo emissão de documentos civis, minicursos, palestras preventivas e entrega de alimentos.
Para além dos números, a ação levanta uma questão importante: por que tantos desses serviços ainda não são estruturais nessas comunidades?
A fala do cacique Waxio Karajá escancara uma realidade que não é nova. "Nossa aldeia é distante da cidade, e essa ação facilita muito, principalmente com os documentos. É algo muito importante para todos nós", afirmou. A emissão de uma certidão de nascimento ou carteira de identidade, que em contextos urbanos é quase banal, assume aqui o peso de um direito básico negligenciado.
Ana Paula Manakiru, moradora da aldeia, foi uma das beneficiadas. Para ela, a possibilidade de emitir a segunda via da certidão de nascimento sem precisar viajar até a cidade foi um alívio. “Muitas vezes não temos como buscar atendimento. Essa ação facilitou muito”, disse.
A primeira-dama e secretária extraordinária de Participações Sociais, Karynne Sotero, participou do evento e reforçou o discurso de inclusão social. Segundo ela, a ação “reforça o compromisso com quem mais precisa”. Na prática, foram levados até a aldeia projetos como o Por Todas as Marias, voltado à conscientização sobre a violência contra a mulher, além da entrega de cestas básicas e atividades voltadas à juventude indígena.
Entretanto, os desafios são mais profundos. O secretário dos Povos Originários e Tradicionais, Paulo Waikarnãse Xerente, reconheceu as dificuldades: “É uma aldeia de difícil acesso. A atuação conjunta facilita a chegada dos serviços, mas isso precisa ser constante, não pontual.”
Além da emissão de documentos, a ação contou com professores bilíngues enviados pela Secretaria de Educação, oficinas de penteados e cortes de cabelo, atividades esportivas e palestras sobre prevenção ao uso de drogas. Foram cerca de 440 atendimentos apenas na Aldeia Fontoura, dos 1.100 realizados desde o início da edição 2025, segundo a Defensoria Pública.
A defensora Letícia Amorim, coordenadora do Núcleo de Questões Étnicas e Combate ao Racismo, enfatizou a importância do trabalho no território. “Estar presente nas aldeias é essencial para compreender as reais necessidades dessas comunidades, que muitas vezes ficam invisíveis para o poder público.”
A edição deste ano começou na última segunda-feira (25), na Aldeia São Domingos, em Luciara (MT), e segue até sexta-feira (29), nas Aldeias Bdè-Burè e Buridina, em Goiás. O roteiro simboliza um esforço de diálogo entre diferentes estados e instituições, mas também revela o quanto ainda falta para que direitos fundamentais deixem de depender de eventos pontuais.
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